sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Educação e Diferença

A proposição da disciplina EDUCAÇÃO, DIFERENÇA E ESTIGMA como obrigatória é fruto de um longo processo de formação e pesquisa da proponente. Em 1992 durante o curso de Doutorado tive a oportunidade de estudar com profundidade a obra de Henri Tajfel “Grupos Humanos e Categorias Sociais”, vocês não podem imaginar a alegre surpresa de notar que o grupo do qual eu pertenço tem sido estudado, pesquisado e têm possibilitado a produção de conhecimento de imenso valor. Essa experiência provocou-me uma série de inquietações sobre a minha formação como pesquisadora. Pois basicamente, uma das premissas defendidas por esse autor é que os grandes crimes da humanidade começam em situações simples, aparentemente banais em nosso cotidiano. Ele alerta: se os pesquisadores se atentassem para esse problemas enquanto eles estão sobre controle, muito sofrimento poderia ser poupado, assim como, muitas vidas. Nossas escolas estão hoje refletindo muito o que acontece em nossa sociedade. Preconceitos, discriminação são parte do cotidiano escolar, surgem situações conflituosas, que muitas vezes nem os alunos e nem tão pouco professor sabem muito bem como agir.

Com essas lições em mente ao concluir o doutorado, preparei o Seminário Especial Diferença, Estigma e Educação, e ao ser submetido para apreciação no colegiado do PPGE, recordo que os comentários destacaram positivamente o fato das temáticas não se restringirem somente a um determinado grupo, mas favorecia uma reflexão profunda de conceitos muitos conhecidos, porém poucos estudados no âmbito educacional. Desde 1996 esse seminário vem sendo oferecido, e com uma procura crescente de interessados, tanto como alunos regulares do PPGE como de outros Programas da UFSC, por exemplo, Psicologia, Literatura, Lingüística, Educação Física, Sociologia. Como também, vários professores e profissionais da Rede de Ensino têm se candidatado como alunos especiais. Isso parece demonstrar que a temática da disciplina aqui proposta é um tema de interesse para pesquisadores em formação. Além disso, tal estudo, mais que ensinar o que fazer, possibilita a busca dos fundamentos para nós construirmos por nós mesmos e questões para nós mesmos resolvermos.

Algumas questões gravitam entorno da Educação e a formação de professores: Por exemplo, por que bebês negros são menos tocados nas creches e nas escolas da educação infantil?
O que fazer numa sala de aula de adolescentes que não querem fazer trabalho em equipe com uma pessoa que tem orientação sexual diferente das deles? O que fazer quando um estudante diz que não pode participar de algumas atividades por questões religiosas? Vamos deixar isso para lá? Ou a maioria escolhe? E as cotas na universidade, isso não nos afeta?

O argumento que o conteúdo aqui apresentado pode ser enfocado em outras disciplinas é factual. No entanto, não invalida que o mesmo seja dado de modo concentrado numa disciplina como a proposta aqui. Vale salientar as possíveis relações com outras disciplinas, por exemplo, o Estágio, o/a estudante quando se deparar com um conflito envolvendo preconceito ou discriminação, ele/ela vai ter ao menos uma noção do que está acontecendo, e terá fundamentação teórica para problematizar e pensar estratégias de intervenção. Nas disciplinas de pesquisa e no TCC o/a aluno/a poderá aprofundar uma situação vivenciada. Vejamos outro exemplo, o tema multiculturalismo é hoje discutido na disciplina Organização Escolar e Currículo, por opção do professor responsável. Uma aluna indaga: como aprofundar e lidar com esse tema, tanto em relação a si mesma, quanto em sala de aula com alunos das séries iniciais? Penso que as disciplinas como Desenvolvimento e Aprendizagem, EJA, Educação Especial, Educação e Infância, e as eletivas, dentre outras, poderão ser beneficiadas com a possibilidade de ter no currículo um espaço para aprofundar temas e conflitos que são suscitados durante as discussões nas respectivas aulas.

Um último aspecto que gostaria de salientar diz respeito aos dias atuais. Vivemos em tempos inquietos, o desrespeito com a nossa própria natureza é sentido em vários ambientes. No que diz respeito ao alerta de Tajfel que grandes conflitos começam na vizinhança, a música de Vandré pode nos motivar a cantar: ♪ já que sabemos, fazemos agora não esperamos acontecer♪ Quem sabe venha a hora em que o Outro não mais nos assuste, e não precisaremos justificar a necessidade de pensar o que é o mal? Enquanto isso não acontece, que Hannah Arendt possa nos iluminar o caminho com sua obra dedicada a indagação: “ uma pessoa que pensa é capaz de fazer o mal? “

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